quinta-feira, 20 de agosto de 2009

lembrancinha

- oi!!! eu trouxe uma lembrancinha pra tu!
- sério? que legal! cadê?
- tá aqui, ó: sabe que dia é hoje? hoje faz um ano que sentamos naquele bar, onde já fomos tantas outras vezes desde então, e conversamos sobre como você estava odiando morar em apartamento porque passou a vida inteira numa casa com terraço e quintal e como você estava se sentindo um pouco claustrofóbica e oprimida pelos vizinhos que policiavam os teus barulhos e, aliás, hoje eu entendo como eles devem ter sofrido com você porque, puta merda, tu fala alto pra caralho e escuta som no último volume, hoje em dia tua audição já deve tar uns 50% comprometida! eu falei pra tu não esquecer os motivos pelos quais você tinha decidido se mudar prum apartamento e aí conversamos sobre como a cidade anda violenta e como, pra evitar os assaltos, acabamos nos tornando prisioneiros, erguendo paredes cada vez mais altas e gradeando janelas. e aí você me falou assim: mas não pense que lembrar dos motivos porque eu me mudei faz com que eu sinta menos falta do meu ex-quintal. e aí eu não soube o que te dizer e dei um gole no meu décimo copo de cerveja. aí notei você num semi-sorriso distraído e fiquei tentando adivinhar que lembrança tava visitando a tua cabeça. e aí parece que você adivinhou que eu tava tentando adivinhar e disse ah, eu tava aqui lembrando que quando eu tinha 9 anos mas aí nesse momento eu preciso confessar que eu já não tava escutando mais nada do que você tava dizendo porque eu tava viajando no desenho dos teus lábios e também segurando uma vontade danada de ir mijar. acho que você reparou que eu não tava prestando atenção porque você começou a fazer uma rosa de guardanapo, se detendo demasiadamente nisso. aí eu aproveitei e fui mijar e quando voltei tu tava no celular e aquilo me incomodou um pouco não sei porquê. quando eu sentei, vi que tinham chegado os bolinhos de bacalhau que eu já nem lembrava que a gente tinha pedido. nesse dia eu fiquei pensando que bacalhau devia ser afrodisíaco porque depois dele a gente começou a conversar umas putarias entre gargalhadas que faziam parte de um jogo de a gente fingir que não sabia como seria o fim daquela noite. certamente não no teu apartamento, pra não incomodar os vizinhos. quando veio a conta, você teve que pagar ela inteira porque a máquina do cartão tava quebrada e eu não tinha dinheiro vivo e eu reclamei com o garçom como é que vocês não avisam isso logo no começo?! e você disse fica tranquilo mas eu tava me sentindo super humilhado no meu machismo. depois fomos ao meu apartamento e eu passei três minutos tentando abrir a porta de casa com a chave do carro e você riu longamente do meu estado, como se você não estivesse tão bêbada quanto eu. depois não tivemos tempo de chegar no quarto e transamos pela sala mesmo, e eu fiquei surpreso com uns truques seus e rimos um do outro durante o sexo, como tivéssemos a intimidade de velhos amantes. depois tu tomou banho no meu banheiro enquanto eu fui rapidamente na geladeira e comi um pedaço de pizza frio enquanto pensava em você e começava desde já a sentir a tua falta. hoje faz um ano que eu me apaixonei.

5 comentários:

  1. Pensei nos assobios agora...não sei porque..:)

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  2. ahhh e tu nunca respondeu a minha pergunta que te fiz sobre o onibus, quando fomos para Belém..fiquei sem resposta...ou tu me respondeu?

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  3. eu escrevo sobre lembranças talvez porque as minhas sejam tão parcas...

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  4. e onde ficará o vazio entre o que se vive e o que se lembra?

    essa lembracinha foi really uma lembrancinha, eu tava precisando 'ver' umas palavras de vocês.

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  5. mais uma cena de tetro na minha cabeça.

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